SINTOMAS (para um novo romance?)
Não terá certamente influência, mas sempre tomo nota: é dia 13 de Junho de 2013.
Evoca-se Fernando Pessoa, tinha de ser: nas ruas, nas festas populares, nas livrarias, nos canais (alguns) de televisão.
Muita cultura? Pouca vida sentida, pouca vida vivida.
Entro num café. Em frente ao balcão, onde vou pedir um leite com chocolate da UCAL ( para o que me havia de dar...) uma senhora de idade.
Digo uma senhora de idade, mas deve ser da minha idade. Podia ser eu.
Hesita, olhando para os bolos e os salgados, enquanto a jovem que está a atendê-la, aguarda, amável, com um sorriso. A senhora hesita porque lhe fugiu de repente da memória o nome do salgado, sim era um salgdo, que queria pedir.
Foi apontando com um dedo, a menina ajudava:
- Um rissol? Estes são de camarão, este de leitão.
-Há rissóis de leitão? inquiriu a senhora, enquanto tentava recordar o nome do salgadinho escuro, triangular, mais ao fundo da travessa.
-Há sim, há de leitão. É o que quer?
-Não, não...é em triângulo, um picante...
-Se calhar é um bolo? um palmier?
-Não, não é bolo.
A senhora apontou com o dedo o triângulo picante, escurinho, que na verdade se via mal, quase debaixo dos rissóis. É aquele.
-Ah, exclamou a jovem, aliviada, não fosse a senhora ir embora e o patrão zangar-se com ela. Isso é uma chamussa. É muito picante, tem a certeza?
-Tenho, tenho.
A senhora também respirou de alívio.
Acontecia-lhe agora com mais frequência escapar-lhe um nome, de pessoa ou de objecto, ou como ali, de comida, no preciso momento em que era preciso nomear.
Indicar seria fácil, mas nomear estava a tornar-se difícil e aborrecido.
Agradeceu: obrigada, menina.
-Pode ir para a mesa, que já levo.
A senhora agradeceu de novo e foi sentar-se.
Eu bebi o meu chocolate ali mesmo, de pé.
Já me tinha acontecido o mesmo. Precisar de um nome e ele desaparecer.
Ao computador dava erros de dislexia.
Mas havia pior: não saber que comprimidos tinha tomado, e quantos.
Esquecer de imediato a conversa que tinha tido.Não o sentido geral, mas a razão da conversa, ou o seu início, coisas assim.
Na hora de pagar, tinha uma nota de vinte euros no bolso, paguei e fiquei à espera do troco.
Olhei para a senhora. Tinha comido a sua chamussa, sem beber nada, nem um copito de vinho branco, nem sequer um café.
Estive quase quase a meter conversa com ela.
O que agora me espanta, é que no acto de escrever esta pequena nota, não é sobre a dificuldade dela que estou a pensar, mas sim em como se escreve a palavra chamussa: com os dois ss que utilizei ou com o ç de cedilha, como se costuma dizer.
Preciso de um dicionário!
Parece-me que é "chamuça" a forma portuguesa. "Samusa" é também usado, e é mais internacional...
ReplyDeleteQuanto aos sintomas também eu os sinto. A todos!(Incluindo a estranheza pela existência de rissóis de leitão).